Carpinteiros do Universo

Carta de Desaniversário

Esta é uma carta de desaniversário. No estilo Alice no País das Maravilhas de sempre vou comemorar o dia 07 de janeiro. Faz poucos dias que estreamos um novo ciclo, trinta e quatro primaveras foram comemoradas. Capricorniana, nascida na ressaca das festas, 02 de janeiro. Por muito tempo acreditei que festas deviam ser lotadas de pessoas, mas este ano decidi inovar.

Eu que sempre fui Alice no meu próprio país de maravilhas e estranhezas, decidi inaugurar um novo ritual. Comemorar o meu aniversário com quem soma a minha alma e agrega sentido de vida. Em um piquenique repleto de cores bonitas somado com vários elementos que colorem o meu mundo interno, desenhei um momento único na minha jornada. Celebrei minhas primaveras sentada na grama, a cabeça ali na lua, o coração repleto de sonhos e uma vontade danada de ser eu mesma. Na companhia dos meus melhores amigos, meus pais improvisamos uma festa repleta de bolhas multicoloridas de espumante, uma maré de coisas boas que não podem ser compradas estavam a nossa disposição. Já que o lado bom da vida não está a venda no supermercado , resolvemos viver sem filtros ou máscaras. Deixei os meus personagens em casa, escondidos dentro do armário. Me vesti de mim mesma, atrapalhada, irônica, moleca e estranha.

Neste rolê aleatório repleto do que o dinheiro não pode comprar, consumimos com exagero uma banquete de prazeres. Histórias, legados, crises de risos, segredos, amizade e claro que o amor sempre presente. Neste piquenique histórico que reinventou o meu pavor de fazer aniversários. Algo que hoje entendo não estar associado ao tão temido medo que muitas pessoas tem de envelhecer, gosto da passagem do tempo e das marcas que ele traz e faz. Envelhecer o corpo, deixar a alma sempre criança é o meu lema. O que eu não curto é multidão, fingir felicidade, conviver por conveniência, socializar. Tudo isso deixa a minha alma exausta, no final me sinto de ressaca, demoro dias para me recuperar. O que incomoda é a hipocrisia, os discursos enlatados e não praticados e a necessidade do materialismo. Gosto de risos compartilhados, comer até doer a barriga, falar bobagem sem medo do julgamento, andar de mãos dados, ganhar colo, me perder na curva de um sorriso sincero. Gosto de declarações olhos nos olhos, palavras gentis ditas com ternura, da presença presente, do celebrar a vida sem precisar ostentar ou mostrar nos holofotes.

Fazer aniversário é uma celebração para lembrar do que somos e para onde vamos. Quais são os nossos planos, os legados que deixamos e queremos deixar. Já que desde as minhas 27 primaveras meu jardim estavam escasso e repleto de medos absurdos. Quando a gente nem sabe quem é, se perde em qualquer esquina. Vive no automático, anseia por dias melhores, mas a desesperança toma conta e um enorme buraco negro de estimação percorre de todos os espaços como capim selvagem. Mas agora quero inaugurar novos horizonte com a pretensão de ser eu mesma. Estar dentro do Espectro Autista trouxe a lucidez necessária que eu precisava para compreender que eu preciso de forma urgente perseguir a minha própria identidade. Por isso dia 02 de janeiro me vesti de mim mesma, inspirada em Alice, mas honrando a garota estranha que sempre sou, parei de encenar.

Sou grande demais para caber em lugares apertados que deixam minha alma claustrofóbica. Preciso aparar as minhas arestas a fim de ser sempre carpinteira de mim mesma. Ter coragem para seguir tendo bondade. Amar e mudar as coisas sempre irão me interessar mais. Aos 34 me sinto mais criança do que já fui. Em alguns momentos a adolescente repleta de impulsos vai tomar conta, com isso a criatividade virá coroar tudo. Mas a adulta que me torno me lembra dos meus deveres e responsabilidades, tenho muitos planos em reticências. Agora vou pegar a minha cesta de vime, preciso colher as flores que estão pelo caminho. Andar como protagonista da minha história, sem aceitar ser figurante. Vou ali, sem destino certo, mas sei que dentro do meu mundo interno habita uma porção de sonhos que precisam ganhar perspectivas.

A garota estranha vai romper algumas barreiras. Construir algumas pontes, instalar alguns muros e abandonar velhos hábitos. Algumas pessoas ficarão a beira da estrada, outras irão surgir e novos amores brotarão de forma aleatória.

Neste emaranhado de perdas e ganhos a menina será fruto da sua própria existência.

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